Bacurau e o Diálogo Social

por Liliane Lana

Reflexão do filme "Bacurau" e dialógo social


Você viu o Bacurau? Essa pergunta pautou várias conversas no segundo semestre do ano de 2020. Afinal, quem viu Bacurau seguramente saiu tocado (e incomodado) por alguma cena, cabeça a mil, reflexões pulsantes. Essa indagação me volta nesses tempos de Pandemia de modo até divertido. É que, sendo profissional da área do Diálogo Social, tenho vivido as angústias de todos os meus colegas: como vamos nos comunicar com as comunidades e outros públicos daqui pra frente? Mais uma das especulações que nos impomos pra pensar o mundo pós-Covid.

Bom, primeiro devo dizer que não sei ao certo se haverá um mundo pós-Covid. O mundo está mudando o tempo todo, e nós vamos mudando com ele sem nos darmos conta. Talvez o pós-Covid já esteja sendo. Mas, voltemos a Bacurau. O filme nos provoca na perspectiva invasora de recursos tecnológicos alterando o modo de vida de uma comunidade remota, instalada no sertão nordestino. Trata também de enfatizar o valor do “um por todos, todos por um”. Na maior parte do tempo, as decisões são tomadas em conjunto, eles se educam e se protegem mutuamente e vivem suas neuroses de modo compartilhado, todos se responsabilizando pelos problemas de todos.


Leia também: UM ABRAÇO À UTOPIA E O MUNDO PÓS COVID 19

A relação do prefeito com aquele povo é muito ilustrativa para o propósito da discussão do diálogo institucional pós-Covid. Habituado à velha (?) política brasileira, o prefeito não consegue interagir com a comunidade. Se ele chega pra visita, todos se escondem em suas casas, de modo articulado, como se vida não houvesse ali. Sem alternativa, ele despeja livros, alimentos e remédios marcando presença (presença questionável, é fato). Eventualmente, ele faz um esforço de comunicação diferenciado: lembra daquele caminhão equipado com grandes telas de vídeo, reproduzindo a mensagem do prefeito para o povo do lugar? Divertidamente, é a esta cena que recorro quando penso numa comunicação surreal em comunidades no curto e médio prazo enquanto uma vacina contra o coronavírus não aparece para nos dar algum alívio.

O caminhão midiático do prefeito de Bacurau é uma inspiração para o contraditório: ainda que não possamos, por algum tempo, viabilizar reuniões com comunidades, os temas difíceis continuarão na pauta. Aliás, o isolamento físico em nada arrefeceu a necessidade de conversar sobre impactos sociais, ambientais e econômicos; ao contrário, a Covid-19 acentua o discurso dos movimentos contrários às práticas atuais de produção e aumenta a necessidade de repensarmos nosso modo de vida.

Não mudou também a necessidade humana de apoiar-se na confiança como veículo para qualquer possibilidade de encontro. O meio de comunicação, portanto, pode ser virtual ou presencial; oneroso ou econômico; moderno ou à moda antiga. O que não pode faltar no diálogo social pós-Covid é aquela mesma confiança de que já nos falava Guimarães Rosa em Grande Sertão Veredas. Aquela confiança que é construída pela nossa capacidade de falar daquilo que nos vulnerabiliza, que abre para o outro as nossas fragilidades. Um vulnerabilizar-se que, ao mesmo tempo em que humaniza os negócios, viabiliza o encontro com o outro, abrindo passagem para o esvaziamento de incertezas, medos e raivas até que seja possível mudar de lugar na dinâmica da comunicação e passar a ouvir o que o outro tenha para dizer.

Não sabendo, ainda, que soluções efetivas teremos para o diálogo social pós-Covid 19, suspeito que será, mais do que nunca, tempo para fortalecimento da Comunicação Interna e Institucional, pautadas pela clareza, transparência e linguagem amigável, de modo a formar novos “embaixadores” que apoiem na disseminação do que precisa ser esclarecido, por necessidade das empresas e por direito das comunidades. Será tempo, também, para intensificar a tradicional conversa um a um, não mais regada a cafezinho mas agora protegida pela máscara e lubrificada pelo álcool em gel.

Conheça também a Company Page da Bridge:  https://www.linkedin.com/company/bridge-comunicacao.


Sobre o filme Bacurau


"Bacurau" é um aclamado filme brasileiro lançado em 2019, dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. O filme mistura elementos de vários gêneros, incluindo o western, o suspense, a ficção científica e o drama, e foi muito bem recebido pela crítica, sendo premiado em vários festivais, incluindo o Prêmio do Júri no Festival de Cannes.


Sinopse


A história de "Bacurau" se passa em um pequeno e remoto vilarejo no sertão de Pernambuco, chamado Bacurau, que misteriosamente desaparece dos mapas. A trama se desenrola após a morte de uma figura importante para a comunidade, a Dona Carmelita, e revela uma série de eventos estranhos que afligem o povo da localidade. A população local logo descobre que está sendo atacada por estrangeiros que têm intenções sinistras. O filme mistura elementos de ficção científica com questões políticas e sociais, explorando temas como resistência, luta pela sobrevivência e as relações de poder.


Temas


"Bacurau" tem uma forte carga de crítica social e política. O filme faz uma metáfora sobre a luta contra a opressão e a marginalização, abordando questões como a desigualdade, o abandono do interior do Brasil pelo poder público e o impacto da globalização. A trama também critica a exploração do sertão e das comunidades rurais por interesses externos, como a grande mídia e os governos, que não compreendem ou não se importam com as realidades locais.


O filme apresenta um enredo de resistência onde a população de Bacurau, liderada por mulheres fortes e decididas, se une para enfrentar uma ameaça externa representada por um grupo de mercenários estrangeiros. Isso dá espaço a cenas de ação intensas e um confronto final que reflete a força do povo diante das adversidades.


Estilo e Influências


A direção de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles oferece uma abordagem única, com um ritmo tenso e uma construção de suspense que mantém o espectador na expectativa. O uso de imagens de western e faroeste se mistura com elementos de ficção científica, criando um ambiente ao mesmo tempo familiar e surreal. O cenário árido do sertão e a música, que mistura ritmos nordestinos com trilha sonora de tensão, também ajudam a criar uma atmosfera única.


O filme também é notável por seu elenco, que inclui artistas renomados como Sônia Braga, Udo Kier e Barbara Colen, e pela forma como utiliza personagens e situações aparentemente simples para transmitir uma mensagem profunda.


Recepção


"Bacurau" foi amplamente elogiado por sua crítica política afiada e por sua abordagem inovadora ao gênero. A obra gerou debates intensos, especialmente por seu tom de resistência, simbolizando uma mensagem de luta contra forças externas que tentam dominar e silenciar a cultura local. O filme é visto como um reflexo das tensões sociais e políticas atuais no Brasil e no mundo.


Onde assistir Bacurau?


Atualmente o filme "Bacurau" está disponível na Globo Play.



Compartilhe

outros artigos

LEIA tambÉM:

mão conectando a ponte para representar a metodologia de gestão social da Bridge, com nome de Conect
Por Bridge Gestão Social 18 de setembro de 2025
Através da Metodologia BRIDGE CONECTA buscamos construir pontes sociais em contextos de tensão e crise. Estudamos muito para elaborar esse método que é fruto também de muitas experiências práticas de construção de conexões.
Laptop and blueprints on wooden beams at a construction site, bathed in sunlight.
Por Bridge Gestão Social 15 de agosto de 2025
Veja como diagnósticos socioterritoriais e uma gestão social ativa são fundamentais para alinhar projetos imobiliários à realidade das comunidades, reduzir conflitos, fortalecer relacionamentos e garantir o sucesso sustentável do empreendimento, a partir da experiência da Bridge Gestão Social.
Homem e mulher conversando sobre os desafios na gestao do relacionamento com comunidades
Por Bridge Gestão Social 15 de agosto de 2025
Descubra como os Comitês de Acompanhamento liderados pela Bridge fortalecem o diálogo, promovem o engajamento com comunidades para construir relações verdadeiramente sustentáveis, mesmo em contextos desafiadores e de conflito já instaurado.
Ver todos